“Como em toda revolução, o ato inicial da
Reforma Protestante foi feito sem que o padre e professor Martinho Lutero
tivesse a noção da dimensão das transformações das quais aquele momento seria o
marco inaugural. Ele queria o debate. E, por isso, afixou suas 95 teses na
porta da Igreja de Wittenberg, num texto em que convidava quem não pudesse
estar presente a apresentar suas ideias por escrito. A Igreja Católica passara
a conceder o perdão mediante contribuições financeiras. Lutero considerava que
isso era venda do perdão, o qual só poderia ser concedido por Deus diante do
arrependimento e da fé. Eram curtas, as teses de Lutero, mas profundas. Como a
de número 76: ‘As indulgências papais não podem anular sequer o menor dos
pecados veniais.’ Foi o começo do fim de uma era.
Em 2017, o ato de Lutero faz 500 anos. A
sucessão dos eventos foi avassaladora. Ele contestava o poder do Papa quando o
mundo queria discutir a separação entre a Igreja e o Estado, e os países
exigiam autonomia nacional. Lutero combatia a ideia de que só os sacerdotes
podiam interpretar o texto sagrado e, por isso, traduziu a Bíblia para
disseminá-la. Com a invenção do tipo móvel por Johannes Gutenberg, estava
aberta a possibilidade de impressão em grande escala. Para que as ideias
avançassem pela Europa, era preciso que houvesse mais leitores, e isso
alavancou os movimentos de alfabetização dos fiéis. O mundo foi mudando. A
própria Igreja Católica passou por mudanças a partir dali. Desafiada, ela
encontrou o caminho de se fortalecer na Contrarreforma.
Apesar de ter nascido de uma discussão
teológica e doutrinária, a Reforma é, sobretudo, uma efeméride laica porque
representou valores universais que marcaram o fim da Idade Média e prenunciaram
o Iluminismo.
Com meu pai, conversava ainda menina sobre a
Reforma, mas, apesar de ser um tempo de maior distância entre as religiões, ele
não a apresentava como uma ideologia anticatólica, mas como um momento de
avanço do mundo das ideias. Afinal, para os protestantes, Lutero não é santo.
Foi apenas um homem que contestou o poder vigente e, naquele momento, ajudou a
abrir as janelas para uma nova forma de pensar.
Por ter tido educação protestante, nunca
achei que 31 de outubro é o dia das bruxas. Sempre foi o dia em que Lutero, em
1517, começou uma revolução”.
POR MÍRIAM LEITÃO
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